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sábado, 29 de novembro de 2008

DEZOITO ANOS, APENAS

Apenas dezoito anos...

O corpo estendido no chão, rijo e frio, parecia implorar ajuda. O rosto não expressava dor nem sofrimento, apenas a alucinante surpresa ante a morte inesperada.

Em meio à gritaria geral só Hermano permanecia em silêncio, traumatizado com o choque da ocorrência brutal, mas, em pensamento e com toda a emoção, suplicava ajuda a Deus por aquele espírito que acabara de deixar o corpo físico em circunstâncias tão trágicas. Sendo espírita, sabia quão doloroso pode ser uma desencarnação prematura, um "abandonar a raia" antes da época determinada.

Conhecia os pais de Anselmo desde os tempos de colégio. Carregara-o nos braços, trocara-lhe as fraldas inúmeras vezes e, agora, aquele anjinho louro transformado em homem, encontrava-se novamente indefeso, inerte e com medo do desconhecido.

Quantas vezes buscara alertar seus pais sobre a educação do menino. Lembrava-se com nitidez de certa tarde de domingo em que se entretinha em companhia de Oscar e Lídia, quando Anselmo contava dez anos de idade.

- Ainda é tempo - dizia-lhes - de se fazer alguma coisa. Não gosto de me intrometer assim, mas acho que estão muito errados. O menino demonstra sérias tendências negativas e vocês não têm o mínimo pulso com ele.

- Você está fazendo tempestade num copo d'água - respondera Lídia. - Meu filho é um amor de menino e tem um coração de ouro. Isso dele não querer estudar é coisa da idade. Conversei longamente com ele ontem sobre isso. Expliquei muitas coisas e ele prometeu que vai voltar a estudar direitinho.

- Promessas como essa ele já vem fazendo há dois anos. Não queira esconder o sol com a peneira, Lídia. Anselmo ainda não terminou o segundo ano. Falsifica as notas do boletim, inclusive a assinatura do coordenador. Passa o dia fora de casa e você nem sabe onde... Além disso já é a quarta vez que você o apanha roubando. Isso é muito sério...

- O que você quer que eu faça, que bata no menino? Nunca...! Acho uma covardia alguém usar de força contra uma criança indefesa. Poderia criar traumas e revoltas prejudiciais para o resto da vida dele. Filho se cria com amor e conselhos. Em casos de maior necessidade pode-se aplicar um castigo. Aliás, isso nós temos feito. Ainda ontem Oscar proibiu Anselminho de sair com a bicicleta porque ele arrombou a porta do meu guarda-roupa .

Hermano sentia-se desanimado. Não adiantava tentar mostrar aos pais de Anselmo que o garoto estava seguindo por um caminho perigoso, mas mesmo assim, continuou:

- A criança é um ser que está iniciando mais uma etapa reencarnatória, trazendo no espírito as tendências boas e más, adquiridas e cultivadas no decorrer das vidas passadas e essas tendências é que devem ser corrigidas, quando negativas, e alimentadas, quando positivas. Os pais não são proprietários de seus filhos, mas sim, depositários da responsabilidade de assisti-los durante os anos do recomeço, orientando e conduzindo para o bem e utilizando todas as suas possibilidades para que sua missão seja bem cumprida.

Fingindo não perceber o ar de desagrado do casal de amigos, pelo sermão, prosseguiu:

- A criança nasce trazendo no inconsciente as predisposições que adquiriu nas vidas passadas. Ela recomeça a vida na matéria através da fase infantil quando, totalmente carente, fica na inteira dependência dos pais. Tudo lhe é estranho e desconhecido. Sua sobrevivência depende totalmente dos cuidados que lhe são dispensados. Aos poucos começa a fazer contato com o exterior, aprendendo a comer, andar, brincar, vestir-se... mas sua experiência ainda não é suficiente para poder conduzir-se sozinha e deliberar sobre os próprios passos. Essa capacidade é aquisição muito lenta, tanto que as leis da terra, muito sabiamente, só conferem maioridade, ou seja, responsabilidade pelos próprios atos, aos 18 anos de idade.

O casal de amigos parecia tocado pelas palavras de Hermano, que continuou:

- É óbvio que toda criança e, principalmente o adolescente, quer se "soltar". É um impulso natural da própria evolução, mas se você soltá-la, isto é, se lhe der o direito de se autodirigir, ela se sentirá insegura, perdida e desamparada, embora muito satisfeita com a possibilidade de dar livre expansão aos impulsos do vulcão interior. Se, por outro lado, os pais lhe indicam as normas ou diretrizes pelas quais deve conduzir-se e em caso de desobediência forçam-na a manter-se dentro da linha programada, mesmo que para isso lhe apliquem castigos mais severos, ela poderá sentir-se revoltada mas ao mesmo tempo segura, por perceber nos pais a mão forte e firme perfeitamente capaz de conduzi-la, até que esteja capacitada a caminhar por si mesma.

- Ser pai ou mãe – continuou Hermano, após breve silêncio - não pede apenas lutar e sacrificar-se para dar conforto e instrução aos filhos. Pede igualmente prepará-los para a vida, não para dela usufruírem qual parasitas, mas para colaborarem na grande obra de construção de um mundo melhor, mais pacífico, justo e equilibrado. A maioria dos pais não tem pulso para educar seus filhos. Cedem às suas vontades, muitas vezes por puro comodismo, acreditando erroneamente que dessa forma estão lhes demonstrando seu amor. Mas é preciso muito mais amor para aplicar no filho um castigo necessário, do que para fazer-lhe concessões, ou dar-lhe presentes. Quem ama realmente seu filho não mede sacrifícios, nem mesmo que esse sacrifício possa consistir numa possível diminuição do apreço filial por causa de um regime disciplinar mais rigoroso, visando educá-lo verdadeiramente, mas, por incrível que possa parecer, o castigo justo só faz cimentar na alma da criança maior confiança e carinho pelos pais. Amar o filho é procurar fazer dele um ser maduro, equilibrado e disciplinado, pois só assim terá maiores possibilidades para uma vida mais proveitosa e feliz no lar, no trabalho e na sociedade. Não pensem que fazendo todas as vontades de Anselmo, estão assegurando seu amor. Vocês o estão perdendo...

Aquelas palavras proféticas vinham agora à mente de Hermano.

Realmente, o garoto fora se perdendo cada vez mais, ante a forma como seus pais entendiam o amor aos filhos. Muito cedo começou a beber, criar casos, brigar e roubar, transformando-se no terror do bairro e, agora, era apenas um corpo estendido no chão, rijo e frio, parecendo suplicar por ajuda. Era agora uma criança livre, sem disciplina, sem pais nem amigos, sentindo vibrar em todo o seu ser espiritual o alucinante pavor da morte, do desconhecido... Ouvia, como de muito longe os gritos desesperados da mãe, mas o elo havia sido cortado por uma punhalada e agora ele estava só, acompanhado apenas pelo cortejo das recordações de uma vida errada. Só... dentro da morte, dentro do desconhecido.

"O PAI QUE NÃO FAZ SEU FILHO CHORAR, CHORARÁ POR ELE..."

(Extraído do livro Um Forró no Umbral, de Saara Nousiainen)

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A Natureza é assim... Deus nos ensina se soubermos estar atentos...

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"Espíritas! Amai-vos, eis o primeiro mandamento; Instruí-vos, eis o segundo."